terça-feira, 10 de janeiro de 2012

VIDA DE MEDONHO

         
        
         Sonhava o adolescente em ser tantas coisas, que mal cabiam os pensamentos em seus devaneios. Evasivas respostas às perguntas inconvenientes tipo: “o que tu vai ser quando crescer?, “médico, advogado, engenheiro?” – Diacho, ele só queria sonhar, mas que droga mesmo.

          Tornara-se comum, verem o menino em passeios nas cercanias da cidadela, empunhando caneta e papel, solitário. Mas e os sonhos? Não creem serem companheiros, amigos até.

          Mas foi sua mãe, mulher de aguda sensibilidade quem primeiro notou. Seu filho já não era mais um infante, despercebido do que o rodeia. Estava apaixonado o guri. Eis a explicação para o olhar “perdido” num nada não perceptível aos desprovidos de paixão e loucura.

          Fazia poemas o medonho. Alcunha esta caída em desuso, após indecifrável aparente apatia.

          A mãe mexeu nos guardados do menino e descobriu algo que a preocupou, mas respirou, acalmou-se. Pois teria que haver explicação. O rapazola, com absoluta certeza havia saído ao avô paterno. Um incontido quando se tratava do sexo oposto. – “teria que haver explicação” – repetia-se ela incessantemente.

          Poemas de amor para Martha, Lucimara, Tânia, Janaína, Thaís, Carlise, etc, etc e etc. O menino precisava de orientação. À quem pedir? Ao pai? Mas este era muito ocupado. À professora orientadora? Mas eram tantas crianças na escola, o problema dele seria apenas mais um. Um psicólogo? E se ele fosse freudiano? Ela seria a culpada. Um psicanalista? E se ele fosse pervertido?

          A mãe vivia aturdida em preocupações. Havia o marido e mais dois filhos para ela cuidar. Para seu descanso os outros tinham maior senso prático que o medonho, que era um sonhador.

          E assim passaram-se os anos. O pai do medonho se aposentou. Os dois filhos práticos casaram-se, estavam bem encaminhados, constituíram família. Os netos eram simplesmente demais. Sorrindo, ela não poupava adjetivos aos descendentes.

          Mas......e o medonho? A tempo nãos se ouvia falar nele. Há muito partira. Como todo sonhador com as mãos abanando. Destino? Talvez a capital, nem ele sabia.

          A mãe tinha um olhar triste e gotículas lhe emanavam dos olhos sob os óculos de espessa lente. Onde andaria aquele medonho que não lhe enviava notícias a dias, meses, anos. Ela já perdera as contas da dor da saudade.

          Mas, era uma manhã de sábado, parecia risonha e prometia um sol escaldante para a tarde. Havia uma brisa disfarçada que enxotava as folhas secas da calçada.

          O relógio assinalava 10h30min quando a mãe como que ativando o sexto sentido, levantou-se bruscamente e ao direcionar o olhar para o portão deparou-se com o pródigo, de cujos olhos brotavam saudades e da boca ósculos de amor.

          O medonho voltara numa manhã de sonho, como em sonho vivera. Era poeta o medonho, cujo sonho realizara.

          Enfim o medonho voltara, mas que saudades plantara, desde os sonhos de guri, ao homem feito, de barba. Mas o sorriso era o mesmo. “Medonho o que tu ta aprontando com essa cara deslavada?” – inquiriu a mãe. E o medonho?

          Este....este....poetava!

Nenhum comentário:

Postar um comentário