terça-feira, 10 de janeiro de 2012

UMA QUASE BIOGRAFIA



      Ele era escritor de olhar perspicaz.
     Há anos escrevia, nada ainda publicara por procurar a perfeição no ato escritural. Criar palavras e expressões era seu objetivo como homem livresco. Queria mesmo era participar ativamente, ao invés de apenas professar o ato cultural como um zumbi. - Esta era sua assertiva predileta.
     Criar, criar e criar era seu lema, nada de seguir o já existente e pré-estabelecido. Cultura dentro de um contexto tragicômico era sua paixão prazerosa.
     Como homem das letras era modesto, considerava-se apenas um gênio, profilático em seus escritos, contra a cultura massificada.
     Dizia que como ele, na capacidade de compreensão e interpretação do momento histórico, somente e talvez Einstein. Sendo que este era bitolado pela ciência, enquanto que ele estava receptivo aos pormenores do dia a dia, enfim era ele, um tímido e bucólico utópico, como gostava de frisar.
     Sua maior glória estava em não ser previsível. Tudo o que escrevia, era sensação na certa. Seu trocadilho inconfesso era: "Ágatha é uma gata da literatura mundial" e ele um gigante da hodiernidade. Seu potencial incomparável não possuía paralelo. Enfim, ele era um solitário, e assim seria descrito nas antologias futuras.
        Um sorriso egocêntrico...era ele deliciando-se como Narciso em sua própria intrepidez literal.
      Fora na juventude professor de Filosofia, época em que perdera a fé nas crenças que levam os homens ao sentimento de culpa e expiação. Sem sombra de dúvida, era ele do tipo liberal profundamente conservador no tocante à religiosidade, inerente ao homem segundo lidos livros, que não se fazem necessárias citações nesta biografia D'ele.
       A sua maior crítica aos poetas, cronistas, contistas, romancistas e mesmo novelistas da literatura brasileira, não querendo citar a internacional, para não demorar-me demasiado, é a previsibilidade. O leitor não precisa sequer arguir a lógica dedutiva, basta ter uma medíocre imaginação e saberá com certeza o final da trama ou do jogo poético.
      Atacara este mal através de artigo, calcado em raciocínio analógico, que infelizmente não publicara por razão absconsa!
      Autodenominava-se um polivalente da literatura. Tinha em seu poder, os alfarrábios de suas criações. Eram poesias, crônicas,contos, fábulas, romances, novelas e críticas de literatura e artes em geral, perfazendo uma obra gigantesca e de qualidade inatacável. Em futuro próximo pretendia registrá-las em órgão competente, para fazer valer-lhe o direito autoral, desconfiado que era do direito advir-lhe pelo simples fato de as publicar.
     Imprevisibilidade, enfim, era sua tônica, tanto que em uma de suas novelas, os personagens inicialmente descritos na trama, sem passagem de tempo algum, não eram os finalistas da mesma. Isto para embaralhar o astuto leitor. Tal era sua megalomania literal.
       Homem de profundos conhecimentos em psicologia feminina, criara personagens fortes e destemidas. Era um apaixonado. Deixara escapar confissão a amigo reticente que tinha uma mulher presa num corpo masculinizado. Em tom irônico dizia ter nascido para elas. Isto era inaudito, tendo ele nascido em família tradicional e de situação econômica estável. Considerava-se um excelente partido. Porém... um solteirão convicto!
      Imprevisíveis foram também as profissões que exercera: professor inicialmente, depois torneiro mecânico autônomo e por último fora bibliotecário municipal, cargo este preenchido através de concurso público. Isto era inacreditável, pois tivera em tenra juventude a possibilidade de cursar faculdades como medicina, odontologia, direito ou outras que dão status social.
      Preferira diplomar-se em Estudos Sociais - Licenciatura Curta, pois não podia dar-se ao luxo de satisfazer a presciência alheia.
      Porém houve um dia que o intrépido escritor e bibliotecário não fora visto em lugar algum e o vento minuano espalhou a notícia de boca em boca e no periódico noticioso, estampada em primeira página a reportagem pré-funérea: -"um curto circuito é causa provável de um incêndio residencial. Não há notícia sobre o inquilino, os bombeiros estão trabalhando no local!"
      O jornal trouxe em edição extraordinária informações como: -"encontrado corpo carbonizado, é provável que seja de Buzilis Jesus Átila Stalin da Silva, solteiro, bibliotecário. Ao que se saiba, sem parente próximo. Foi encontrado junto ao corpo uma caixa de metal tipo arquivo, intacta, porém seu conteúdo fora dizimado pela incandescência e vigor do fogo havido. Eram papéis segundo os peritos, cujo teor está perdido!"
        O seu desaparecimento, assim como o final de sua carreira literária, fora imprevisível!
        O que vos relatei caro leitor, foi o depoimento emocionado de Júnior, último parente vivo, com genes do finado. Realmente não havia como prever isso.
        E a biografia? É isto que perguntas? Sei lá, demanda pesquisa...vou ver o que posso fazer!

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